O mundo inteiro está preocupado com o impacto do governo de Donald Trump na agenda ambiental, analistas têm pontuado, no entanto, que o reflexo nos negócios deve ser limitado.
Isso porque, para alguns segmentos, as mudanças climáticas ganharam um protagonismo definitivo. Entre esses setores está o de seguros, aponta a pesquisa “Next in Insurance 2024”, da consultoria e auditoria PwC, que analisa os desafios e oportunidades do setor.
Riscos antes considerados improváveis, tanto climáticos, como sociais e tecnológicos, se tornaram mais severos nas últimas duas décadas. Atualmente, 15% dos clientes em todo o mundo, mostra a PwC, já buscam soluções de seguros baseadas em modelos ESG, como cobertura de edifícios verdes ou tecnologias limpas.
As enchentes no Rio Grande do Sul, as secas no Norte representaram uma virada no mercado de seguros no Brasil, diz Dyogo Oliveira, presidente da Confederação Nacional das Seguradoras (CNSeg).
– A questão é climática, tem impactado cada vez mais o setor de seguros. Em alguns lugares, como temos acompanhado da Califórnia, chegou-se a uma situação extremada, que em alguns casos tem até inviabilizado o seguro porque os incidentes são tão frequentes e tão severos que já não é mais uma questão de risco, é certo que vai acontecer e que ninguém consegue dimensionar o tamanho do prejuízo, do impacto.
No Brasil, as coisas continuam num nível muito diferente. A gente tem observado um crescimento realmente dos incidentes climáticos e da severidade desses eventos. O ano passado, por exemplo, houve um pagamento de indenizações de mais de R$ 6 bilhões no Rio Grande do Sul. Esse montante, no entanto, está dentro das estimativas das reservas técnicas do setor de seguros.
Segundo Oliveira, o seguro rural é eminentemente climático. E conta que a CNseg tem trabalhado junto às seguradoras e ao governo para desenvolver um programa que permita um melhor entendimento dos eventos climáticos para que as empresas do setor possam incorporar esse risco de uma maneira mais adequada nas suas projeções:
– Isso envolve o desenvolvimento de modelos climáticos, é em um prazo mais adequado para o seguro. Nós temos previsões climáticas de curto prazo, que são muito boas para uma semana, para duas semanas, e temos modelos de previsão de longo prazo para 10 anos, 20 anos.
Mas modelos de um ano, dois anos, que seriam mais adequados ao setor de seguros, ainda precisam de desenvolvimento. A gente vem trabalhando isso junto aos institutos de pesquisas, entre instituições que tratam dessa questão de clima e de previsões.
No Brasil, a questão climática ainda é controlável do ponto de vista de impacto de seguros. Mas preocupa muito porque a gente tem percebido esse aumento tanto do número de eventos quanto da gravidade desses eventos.
O que impressiona é que, numa pesquisa feita pela PwC há dois anos, as questões climáticas, que estavam entre os cinco maiores riscos apontados por seguradoras e resseguradoras na análise global, sequer apareciam entre as dez principais preocupações do mercado brasileiro.
A perspectiva é que apareça no ranking quando o levantamento voltar a ser feito no segundo semestre, avalia Maria José Cury, sócia da PwC Brasil e líder do setor de Seguros da autoria e consultoria.
As seguradoras, diz Maria José, começam a usar tecnologia integrada para impulsionar eficiência e inovação, e colaborar para mitigar riscos climáticos crescentes. Isso começa a acontecer principalmente no seguro agro, conta, em que sensores nas plantações informam tanto ao produtor quanto a seguradora, em tempo real, riscos de estiagem, excesso de chuvas, que são riscos à produção.
– As mudanças climáticas estão entre as oportunidades de transformação e de negócios do setor de seguros. O setor tem o desafio de usar a tecnologia de uma forma integrada. Hoje há silos, como atendimento, o uso de Inteligência Artificial em chat bot, levantamento de dados, são questões pontuais. É preciso interligar tudo para ter produtos mais eficientes.
Entre os produtos inovadores que começam a surgir no setor, a sócia da PwC cita os paramétricos, que protege de eventos climáticos severos, contratos que oferecem garantias e coberturas adicionais que incentivam o segurado ao uso de tecnologia ou material que reduzam a emissão de gases de efeito estufa.
– O uso da tecnologia permite a customização de seguros e que ele fique mais acessível, com mais dados que permitam uma precificação mais adequada. Há muito espaço para expansão do segmento no país.
Hoje, o setor está estacionando em 3,6% do PIB. Para se ter uma ideia, nos EUA representa 12% e no Reino Unido, 11% do PIB. Apenas 10% da população brasileira é segurada e, entre os carros, o seguro mais popular por aqui, o percentual é de apenas 30%.
Fonte: O Globo I CQCS