Recurso Especial n. 1616359/RJ: a primeira manifestação do Superior Tribunal de Justiça sobre associação de proteção veicular

No ano de 2018, muitas foram as discussões a respeito das associações de proteção veicular, seguradoras e o contrato de seguro.

Apesar do avanço da discussão parlamentar que há acerca do tema na Câmara dos Deputados, por ora, é a jurisprudência que vem exercendo papel determinante em relação ao assunto.

Isso porque, a doutrina atual fala de maneira genérica sobre as associações e o auxílio mútuo, de modo que a jurisprudência, diante dos casos concretos, é que está conceituando, distinguindo ou analisando as semelhanças da figura da proteção veicular concedida por associações, em comparação com o seguro privado comercializado pelas seguradoras.

E, dentre todos os casos, o mais emblemático até presente momento, certamente é o acórdão da 2ª Turma do STJ, proferido nos autos do recurso especial n. 1616359/RJ, de relatoria do Eminente Ministro OG Fernandes, interposto pela Superintendência de Seguros Privados – SUSEP, em demanda que a autarquia propôs em desfavor da Associação Mineira de Proteção e Assistência Automotiva – AMPLA.

No REsp n. 1616359/RJ, o Ministro Relator OG Fernandes, ao analisar a violação do artigo 757 do Código Civil e dos artigos 24, 78 e 113, todos do Decreto-Lei n. 73/1966, constatou que o produto disponibilizado pela AMPLA configura típico contrato de seguro.

Esclareceu, portanto, que a AMPLA realiza a cobrança de franquia e disponibiliza cobertura diante de sinistros provocados por terceiros ou por eventos da natureza, características essas que compõem um contrato de seguro de danos. Ainda, o Ministro afirmou que o fato de não haver um prêmio, mas sim um valor tabelado a ser pago pelo adquirente, não descaracteriza por si só o contrato de seguro de danos.

De outro lado, o Ministro assinalou que a AMPLA também não pode ser classificada como grupo restrito de ajuda mútua, a teor do que dispõe o Enunciado n. 185 da III Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal, haja vista que disponibiliza seu produto de maneira abrangente.

Desse modo, para o Ministro, a abrangência da disponibilização do produto faz deduzir que a AMPLA assume o risco contratado como se fosse uma típica seguradora, pois a proteção automotiva é aberta a um grupo indeterminado de interessados. Além disso, explicou que “[…] tanto se trata de atividade que não encontra amparo na legislação atualmente vigente que a própria parte recorrida fez acostar aos autos diversos informes a título de projetos de lei que estariam tramitando no Poder Legislativo (e-STJ, fls. 789-811), a fim de alterar o art. 53 do Código Civil/2002, para permitir a atividade questionada nesta demanda. Ora, tratasse de ponto consolidado na legislação pátria, não haveria necessidade de qualquer alteração legislativa, a demonstrar que o produto veiculado e oferecido pela recorrida, por se constituir em atividade securitária, não possui amparo na liberdade associativa em geral e depende da intervenção reguladora a ser exercida pela recorrente.”

E prossegue esclarecendo que, sendo o produto da AMPLA um típico contrato de seguro, é pertinente e deve ser imposta a atuação da SUSEP, autarquia federal constituída justamente para regular o mercado de seguros, nos termos dos artigos 24, 78 e 113 do Decreto-Lei n. 73/1966. E esse controle estatal tem razão de existir, porque as seguradoras administram fundos comuns ou de poupança coletiva, o que exige do Estado atenção especial.

Nesse contexto, o Ministro Relator concluiu que não há vedação para que a AMPLA se constitua como grupo restrito de ajuda mútua, mas isso só poderá ocorrer se ela enquadrar-se nas regras do Decreto-Lei n. 2.063/1940 e da legislação correlata, observando o Enunciado n. 185 da III Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal. (BRASIL, 2018).

Em decorrência disso, o Ministro Relator deu provimento ao recurso especial interposto pela SUSEP para restabelecer a sentença, que declarou a ilicitude da atuação da AMPLA no mercado de seguros e determinou a imediata suspensão de suas atividades concernentes a este mercado, proibindo-a, permanentemente, de efetivar a oferta, veiculação, anúncio, cobrança ou comercialização de produtos pertinentes à atividade securitária.

Autor: Eron Corrêa a Silva, bacharel em direito.

Referências:

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1616359/RJ. Relator: Ministro OG Fernandes. Brasília, DF, 19 de junho de 2018. Brasília, Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/processo/pesquisa/?aplicacao=processos.ea&tipoPesquisa=tipoPesquisaGenerica&termo=REsp%201616359 . Acesso em: 14 out. 2018.